“Nunca falei nada para ninguém porque tinha vergonha, não sabia o que fazer. Se falasse para o meu pai, ele acharia que a culpa era minha, que eu provocava. Deviam ter notado que havia algo de errado; que eu, sempre muito falante, tinha virado uma pessoa calada”.
Segundo Xuxa, o pai dela, Luís Floriano Meneghel, era militar e sempre foi muito ausente e distante. A mãe, Alda Meneghel, de acordo com a apresentadora, era muito amorosa e presente, mas inocente. Tinha que cuidar de cinco filhos e não reparou:
“Eu não tinha experiência, não sabia o que fazer. Me calava porque me sentia suja, errada, achava mesmo que a culpa era minha, das minhas roupas, do meu jeito. Até hoje me sinto culpada. Mas a gente não pode pensar assim. Porque uma criança não sabe o que fazer em uma situação dessa”.
Sem ter dado detalhes sobre a violência nem ter dito em que idade ela começou, a apresentadora foi enfática. Garantiu que, se não tivesse o amor da mãe, teria saído de casa, como fazem muitas crianças que hoje vivem na rua e precisam se prostituir ou roubar para sobreviver.
Na entrevista, Xuxa falou ainda sobre o início de sua carreira como modelo, dos seus amores, do medo de envelhecer. E garantiu que o trauma afetou sua vida afetiva:
“Por que você acha que eu não consigo me casar? Deve ter uma explicação. Talvez eu tivesse que passar por isso tudo para hoje querer lutar por essas crianças. Tenho o sonho de que, um dia, nenhuma criança seja vítima de abuso”, disse, chorando.
No quadro do Fantástico, Xuxa revelou também que recebeu uma proposta para casar e ter filhos com Michael Jackson quando fazia um trabalho na Espanha, em 1992.
“A assessoria dele me chamou para ver um show e, como eu era muito fã dele, claro que aceitei. Logo depois me convidaram para ir a Neverland (residência do cantor na época), jantamos, vimos um filme, ele sabia tudo da minha vida. Logo depois, o empresário dele perguntou se eu não gostaria de formar uma família com Michael”.
Nas palavras da apresentadora, eles achavam a ideia interessante porque ela trabalhava com crianças na América do Sul e ele gostava de crianças.
“Michael me mostrou clipes que ele tinha feito com crianças, eu chorei, ele pegou na minha mão, eu chorei mais, mas disse que não, que, para mim, ele era só um ídolo”.
Xuxa falou ainda sobre alguns amores de sua vida, menos numerosos do ela que gostaria. Com Pelé, ficou de 1981 a 1986.
“Muita gente falou que eu estava com ele por interesse, quis até terminar no início do namoro por causa disso. Ao contrário do que se pensa, gostei muito dele”.
Mas o grande amor da vida da apresentadora foi o piloto Ayrton Senna.
“Foi a única pessoa com quem pensei em me casar, combinávamos em tudo. Terminamos porque trabalhávamos muito”.
O namoro durou de 1988 a 1989. Mas, segundo Xuxa, eles continuaram se falando periodicamente.
“Na véspera do acidente que o levou embora (ocorrido em 1 de maio de 1994), estava decidida a procurá-lo para dizer que ele era a minha alma gêmea e perguntar se ele sentia o mesmo por mim. Um dia vamos nos encontrar de novo”.
Ela disse que hoje é difícil encontrar um homem que entenda a sua independência e a prioridade que ela dá à filha e ao trabalho. Mas que, às vezes, os hormônios falam mais alto e ela sente falta de um relacionamento amoroso.
“Entre quatro paredes, eu não penso em nada, nem em ninguém, só no momento. E dependo muito do cara. As poucas pessoas que me conhecem falam ‘nossa, não sabia que você era assim’. Será que os caras acham que na hora H eu vou cantar ‘tá na hora, tá na hora’ e ‘é bom estar com você’?”
Sobre os 49 anos de idade e envelhecimento, Xuxa se disse tranquila.
“O tempo é cruel, as coisas caem. Às vezes dá vontade de esticar a pele, mas não consigo. Entendo que tem gente que fica afoita, que quer esticar tudo, mas fica com cara de tamanco, todo mundo igual. Não quero isso, estou bem assim”.
E sobre os 32 anos de carreira, a apresentadora, nascida em Santa Rosa, no Rio Grande do Sul, e crescida no subúrbio de Bento Ribeiro, no Rio, demonstrou estar satisfeita com a trajetória de modelo à ídolo nacional, apesar do preço alto da fama.
“Não tenho liberdade nenhuma, nem privacidade. Não deixo de ir a shoppings, mas, quando vou, é quase um evento. Me sinto mal, como se estivesse atrapalhando as pessoas. Mas aprendi que esse é o preço. É alto, mas tenho muita coisa, não quero abrir mão. Não só aceito, como gosto e quero o assédio das crianças”.
Casos como o de Xuxa são frequentes. Levantamento feito pelo Instituto de Segurança Pública (ISP) do Rio de Janeiro em 2010, constatou que, de um total de 4.589 mulheres violentadas naquele ano, 23,2% tinham até 9 anos de idade. As vítimas de 10 a 14 anos respondiam por 30,3% dos casos e as de 15 a 19 anos, 15,3%. Em 2011, foram registrados 4.871 casos. E, de acordo com a instituição, nos últimos onze anos, a quantidade de registros aumentou 88,5%.
Denúncias de abuso sexual contra crianças e adolescentes podem ser feitas, por telefone, através do número 100, serviço do Disque Denúncia Nacional de Abuso e Exploração Sexual contra Crianças e Adolescentes. O serviço funciona diariamente de 8h às 22h, inclusive nos finais de semana e feriados.